AS SAÚVAS BRIGONAS
A Abelha-mestra acordou as duzentas abelhinhas de sua colméia e falou :
-Meninas, hoje o mel deve estar fabuloso : não percam tempo, aproveitem a manhã.
-Partiram as duzentas abelhinhas voando. Espalharam-se pelos jardins, sugaram o mel especial de papoulas e madressilvas, mas suspiraram de saudade quando passaram pelo pé de rosa-chá. Desde muito tempo esperavam pela rosa mais querida das abelhas, não havia meio de nascer um botão.
De outro lado, dentro do formigueiro, a rainha das saúvas também acordou e foi logo ordenando :
- Cortadeiras, despertem! Em direção ao pé de rosa-chá, marchem!
Uma formiga-chefe abriu o desfile e mais de mil formigas, de ferrão arreganhado, saíram para cortar folhas e brotos, com ordem de não voltar enquanto não visse os galhos pelados.
A Primavera passou no vento e suspirou :
- Veja, ventinho da manhã, acabei de vestir a roseira mais querida das abelhas e olhe a tropa das formigas rasgando as folhinhas novas!
- Saúva só sabe comer! - disse o vento, já zangado. - Deixe estar, vou varrer para longe as folhas cortadas e as saúvas vão morrer de fome!
Disse e saiu ventando. Soprou à volta da roseira, espalhou as folhas para longe.
A formiga-chefe zangou-se, vendo todo o trabalho perdido. Já ia manda recado à sua Rainha, pedindo as tropas carregadeiras, mas resolveu outra coisa. Gritou para as cortadeiras :
- Fechar as tesouras! Para casa, marchem!
- No formigueiro contou tudo à Rainha e fofocou :
- O vento fez isso porque é namorado da roseira!
- Ele me paga - disse a rainha furiosa. -Não há de cheirar nem uma rosa este ano!
O vento ouviu tudo e avisou :
- Guerra é guerra, dona Rainha, e se estamos em guerra, prepare-se para o pior.
- Vento não sabe o que diz - resmungou a formiga.
Virou-lhe as costas e foi dar ordens às mastigadoras de folhas.
O vento subiu o morro e assobiou na toca do tamanduá.
-Que ventania, seu Vento! Está zangado?
O vento contou como a Primavera estava triste por causa das formigas.
-Ora essa, entristecer a Primavera? Isso não se faz. É ela quem tras as flores, é ela quem faz os dias mais bonitos do ano, é ela quem dá vontade de cantar e...
- E sou eu - disse o vento - que ajudo a espalhar as semente e o perfume das flores. Estou muito zangado com as saúvas e até vim pedir para o senhor ser meu aliado nesta guerra.
Pois não - disse logo o tamanduá. -Estou com três tamanduazinhos meio magros em casa e prometo dar cabo dessas saúvas.
Chamou os filhotes :
- Meninos, hoje temos piquenique perto da roseira mais querida das abelhas.
- Tenho medo de gente - falou um filhote medroso : -Prefiro não descer o morro.
- Mas tem de ir defender a roseira e aprender a ser tamanduá! - falou o pai. - Vamos todos : um bom passeio e uma boa ração de formigas não se rejeitam.
O vento desceu o morro com os tamanduás e ficou de avisar se aparecesse gente. Passaram por baixo de uma cerca e chegaram ao formigueiro.
A formiga-porteira, quando os viu, perdeu a fala e morreu de susto. Nem pôde avisar a Rainha, como era sua obrigação.
- Socorro! - gritaram as cortadeiras, quando viram entrar pelo formigueiro a língua comprida do pai tamanduá. Mas não puderam dizer mais nada, porque já estavam coladas, enroladas, engolidas e mortas dentro da barriga do guloso. Pelos corredores do formigueiro as saúvas se atropelavam, se atrapalhavam, subiam umas por cima das outras, querendo fugir. Mas por todos os lados atacavam os tamanduás e em pouco tempo não havia mais formigas no formigueiro.
- Quem comeu a rainha? - perguntou o pai tamanduá, levantando a grande cauda peluda.
-Estava gostossíssima - falou o filhote medroso, mas não é melhor voltarmos para casa?
O vento, todo alegre, foi contar tudo à Primavera.
-Vamos dar uma festa! -disse ela. -E há de ser no dia em que se abrir a primeira rosa-chá.
Convidou abelhinhas, colibris, borboletas e crianças amigas de flores. Encheu os jardins de perfumes e dias bonitos. O vento ajudou, limpou os caminhos, juntando todo o lixo pelos cantos.
Quando nasceu a primeira rosa-chá, a roseira convidou a Primavera para madrinha e o vento para padrinho. O sol e a chuva quiseram ver o batizado e foram juntos, levando o filho deles, o arco-íris.
Todos dançaram em volta da roseira e, como o tamanduá não pudesse descer para a festa, o vento lhe foi levar de presente um caderninho. E sabem o que havia escrito no caderninho? Havio o endereço de todos os formigueiros de saúva do mundo.
Mas acontece que são tantos, que os tamanduás e o vento só vencem batalhas, ainda não ganharam a guerra.
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